"Afastar muitos para longe do rebanho, foi para isso que eu vim!" Nietzsche

quarta-feira, 6 de julho de 2016

"Anda bater, tu bates bem. Se perdermos que se foda"...


O texto é um bocado extenso, mas acredita que vai mesmo valer a pena. AO CONTRÁRIO DE OUTRAS MERDAS QUE SE VÊEM NO FACEBOOK. LÊ E VAIS PERCEBER, EHEH...

Muito se tem dito da linguagem do Capitão da selecção Cristiano Ronaldo, do CR 7, ou simplesmente O Comandante. A frase "anda bater, tu bates bem. Se perdermos que se foda", escandalizou os ouvidos mais pudicos, castos e pedantes.
Mas aqui está um exemplo de como a língua portuguesa é linda. E que mesmo o vernáculo, tem e deve ser usado em alturas próprias e que pode ser tão inspirador e erudito como os sonetos decassílabos, da imortal obra literária "Os Lusíadas" do Grande Luís Vaz de Camões.
Se calhar poucos ouviram falar de Millôr Viola Fernandes, ou simplesmente, Millôr Fernandes?! Este cavalheiro também era um amante da língua Portuguesa. Nasceu e viveu no outro lado no atlântico, no país irmão o Brasil. Foi cartoonista, humorista, dramaturgo, escritor, poeta, tradutor e jornalista. É considerado uma das principais figuras da imprensa brasileira no século XX.
Mas isso não é o mais importante. A questão é que ele como o Ronaldo, o Bocage, os Ena pá 2000, o Ricardo Araújo Pereira, o Miguel Esteves Cardoso, o José Mário Branco, ou mesmo o nosso prémio Nobel da literatura José Saramago, e como tantos outros "faladores" e amantes da língua Portuguesa. Enalteceram e elevaram o uso do vernáculo a um nível superior. Millôr Fernandes deixou obra sobre esta temática. Deixo-vos um texto deste senhor intitulado "Foda-se" que resume na perfeição o que tento passar.
FODA-SE (por Millôr Fernandes)
O nível de stress de uma pessoa é inversamente proporcional à quantidade de "foda-se!" que ela diz.
Existe algo mais libertário do que o conceito do "foda-se!"?
O "foda-se!" aumenta a minha auto-estima, torna-me uma pessoa melhor.
Reorganiza as coisas. Liberta-me.
"Não quer sair comigo?! - então, foda-se!"
"Vai querer mesmo decidir essa merda sozinho(a)?! - então, foda-se!"
O direito ao "foda-se!" deveria estar assegurado na Constituição.
Os palavrões não nasceram por acaso. São recursos extremamente válidos e criativos para dotar o nosso vocabulário de expressões que traduzem com a maior fidelidade os nossos mais fortes e genuínos sentimentos. É o povo a fazer a sua língua. Como o Latim Vulgar, será esse Português Vulgar que vingará plenamente um dia.
"Comó caralho", por exemplo. Que expressão traduz melhor a ideia de muita quantidade que "comó caralho"?
"Comó caralho" tende para o infinito, é quase uma expressão matemática.
A Via Láctea tem estrelas comó caralho!
O Sol está quente comó caralho!
O universo é antigo comó caralho!
Eu gosto do meu clube comó caralho!
O gajo é parvo comó caralho!
Entendes?
No género do "comó caralho", mas, no caso, expressando a mais absoluta negação, está o famoso "nem que te fodas!".
Nem o "Não, não e não!" e tão pouco o nada eficaz e já sem nenhuma credibilidade "Não, nem pensar!" o substituem.
O "nem que te fodas!" é irretorquível e liquida o assunto.
Liberta-te, com a consciência tranquila, para outras actividades de maior interesse na tua vida.
Aquele filho pintelho de 17 anos atormenta-te pedindo o carro para ir surfar na praia? Não percas tempo nem paciência.
Solta logo um definitivo:
"Huguinho, presta atenção, filho querido, nem que te fodas!".
O impertinente aprende logo a lição e vai para o Centro Comercial encontrar-se com os amigos, sem qualquer problema, e tu fechas os olhos e voltas a curtir o CD (...)
Há outros palavrões igualmente clássicos.
Pense na sonoridade de um "Puta que pariu!", ou o seu correlativo "Pu-ta-que-o-pa-riu!", falado assim, cadenciadamente, sílaba por sílaba.
Diante de uma notícia irritante, qualquer "puta-que-o-pariu!", dito assim, põe-te outra vez nos eixos.
Os teus neurónios têm o devido tempo e clima para se reorganizarem e encontrarem a atitude que te permitirá dar um merecido troco ou livrares-te de maiores dores de cabeça.
E o que dizer do nosso famoso "vai levar no cu!"? E a sua maravilhosa e reforçadora derivação "vai levar no olho do cu!"?
Já imaginaste o bem que alguém faz a si próprio e aos seus quando, passado o limite do suportável, se dirige ao canalha de seu interlocutor e solta:
"Chega! Vai levar no olho do cu!"?
Pronto, tu retomaste as rédeas da tua vida, a tua auto-estima.
Desabotoas a camisa e sais à rua, vento batendo na face, olhar firme, cabeça erguida, um delicioso sorriso de vitória e renovado amor-íntimo nos lábios.
E seria tremendamente injusto não registar aqui a expressão de maior poder de definição do Português Vulgar: "Fodeu-se!". E a sua derivação, mais avassaladora ainda: "Já se fodeu!".
Conheces definição mais exacta, pungente e arrasadora para uma situação que atingiu o grau máximo imaginável de ameaçadora complicação?
Expressão, inclusivé, que uma vez proferida insere o seu autor num providencial contexto interior de alerta e auto-defesa. Algo assim como quando estás a sem documentos do carro, sem carta de condução e ouves uma sirene de polícia atrás de ti a mandar-te parar. O que dizes? "Já me fodi!"
Ou quando te apercebes que és de um país em que quase nada funciona, o desemprego não baixa, os impostos são altos, a saúde, a educação e … a justiça são de baixa qualidade, os empresários são de pouca qualidade e procuram o lucro fácil e em pouco tempo, as reformas têm que baixar, o tempo para a desejada reforma tem que aumentar … tu pensas “Já me fodi!”
Então:
Liberdade,
Igualdade,
Fraternidade
e
foda-se!!!
Mas não desespere:
Este país … ainda vai ser “um país do caralho!”
Atente no que lhe digo!
Resumindo, o Millôr Fernandes e o Ronaldo, são grandes comó caralho...