Os dados divulgados no início desta semana pela OCDE são taxativos: «Portugal continua a ser dos países em que o financiamento público menos cobre as despesas de saúde», o que nos coloca na cauda do conjunto de Estados membros daquela organização. De facto, Portugal chega mesmo, em 2012, a ocupar o último lugar na Europa dos 15, com uma despesa pública em saúde em percentagem do PIB de 5,9% (que é assim inferior à da Grécia, situada em 6,2%). E se em 2010 este indicador estava em linha com a média observada na OCDE (6,8%), sendo contudo inferior à média dos países da UE15 (7,8%), as diferenças acentuam-se em 2012, com praticamente menos um ponto percentual face à média da OCDE e com quase menos dois pontos percentuais de diferença face à média dos países da Europa dos 15. Não é à toa, portanto, que se escolhe ir, em dobro, «além da troika».
O peso da despesa pública em saúde, ao ser «calibrado» em percentagem do PIB, tem um significado muito relevante. Ele diz-nos, no fundo, que parcela da riqueza produzida por um país decide o governo afectar ao sector, evidenciando assim o grau de importância que lhe é atribuído no quadro geral da despesa pública. Podemos, na verdade, produzir menos riqueza que a Alemanha, a Holanda ou a Dinamarca. Mas o que está em causa é outra coisa: relativamente à riqueza que produzimos, o Estado português gasta proporcionalmente menos com saúde do que os Estados desses países. E essa constatação deveria bastar para desmentir todas as narrativas fraudulentas e populistas - a la Medina Carreira - em torno das pretensas «gorduras do Estado Social» e da sua suposta «desmesura» e «insustentabilidade», face às «capacidades» da «economia real» para «suportar» esses «encargos».
Perante estes dados - que evidenciam o afastamento crescente de Portugal, desde 2010, em relação à OCDE e à UE15 - causa pois a maior das perplexidades que o Comissário Europeu da Saúde, Tonio Borg, tenha tido a descomunal lata de considerar que, no quadro do Memorando de Entendimento assinado com a troika, «as reformas foram bem sucedidas a reduzir a despesa em saúde em percentagem do Produto Interno Bruto». Para concluir, ainda com maior despudor, que «os cortes serviram para evitar o colapso do sistema de saúde português». Colapso? Mas que colapso? Estará porventura o comissário europeu a sugerir que «evitámos», desta forma, o tenebroso «risco» de afectar, ao sector da saúde, uma parte da riqueza nacional proporcionalmente equivalente àquela que a generalidade dos países europeus lhe dedica?...
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